Clipping – Especialistas discutem legislações emergenciais no Brasil, EUA e Portugal
Com a crise causada pelo novo coronavírus, diversos países tiveram que editar uma série de leis para mitigar os efeitos da pandemia. Algumas dessas alterações foram tratadas no seminário “Saída de Emergência”, exibido pela TV ConJur nesta segunda-feira (25/5), com o tema “Leis Emergenciais na Experiência Comparada”.
Participaram do seminário online Dario Moura Vicente, professor catedrático da Universidade de Lisboa; Laura Schertel Mendes, professora da Universidade de Brasília (UnB); o deputado federal Enrico Misasi (PV-SP), relator do Projeto de Lei 1.179; e Luiz Henrique Alochio, conselheiro federal da OAB. A mediação foi feita por Otavio Luiz Rodrigues Jr., conselheiro do CNMP e professor da Universidade de São Paulo (USP).
Portugal
De acordo com o professor Dario Moura Vicente, Portugal agiu rápido para mitigar os efeitos da pandemia, decretando estado de alerta um dia depois de a Organização Mundial da Saúde declarar situação de pandemia. O estado de emergência veio logo depois, em 18 de março, quando as medidas de isolamento passaram a valer com mais força.
A exemplo do resto do mundo, explica, grande parte das medidas emergenciais adotadas no país europeu tiveram como foco o Direito Trabalhista.
Para proteger os postos de trabalho, foram adotadas iniciativas de redução salarial, de modo que os empregados passaram a receber 2/3 do salário, sendo 70% desse valor bancado pelo estado e o restante pela empresa.
Segundo conta o professor, cerca 10 mil empresas foram beneficiadas pela medida, que atingiu aproximadamente 1,2 milhões de trabalhadores portugueses (30% da força de trabalho do país).
“O número de dependentes do Estado é de 6 milhões (60% da população). Minha nota final é de certa preocupação. As leis emergenciais contiveram os aspectos mais nocivos da pandemia. Mas terão um preço em termos econômicos e sociais muito significativos”, afirma, levando em conta o fato de Portugal ter uma dívida pública muito alta.
Estados Unidos
Já o conselheiro Luiz Henrique Alochio ressalta que, embora a tônica nos Estados Unidos sempre tenha sido a de que o governo não deve interferir nas relações privadas, os norte-americanos acabaram se rendendo às iniciativas transitórias para enfrentar a crise.
“Para o norte-americano mediano, falar em verba para saúde pública é uma bomba atômica, ainda que isso vá para pesquisas. No entanto, muito dinheiro passou a ser destinado para a área de pesquisa, fundos de saúde e para a realização de exames”.
Outras medidas colocadas em curso no país, segundo explica Alochio, envolvem o financiamento de alimentação e realização de exames, proteção aos profissionais que atuam na linha de frente da saúde e injeção de dinheiro na renda das famílias.
“Também está ocorrendo uma massiva inversão de verba pública para a manutenção de postos de trabalho, lidando de modo diferente com empresas de pequeno e grande porte”.
Brasil
Parte da discussão abordou justamente o PL 1.179, aprovado pelo Senado no último dia 19/5. A proposta suspende temporariamente normas do Direito Privado enquanto durar a epidemia da Covid-19 no Brasil.
“O objetivo principal foi reafirmar perante o Judiciário e para toda a sociedade brasileira que nós temos em nosso Código Civil e em nossa lei civil conceitos estabelecidos, como a teoria da imprevisão e da onerosidade excessiva. Portanto, nós precisávamos blindar nosso Direito sobre pleitos oportunistas e produzir certa coerência na jurisprudência”, destaca Enrico Misasi.
O deputado explica que o PL introduz mudanças temporárias e tem por finalidade apenas ajustar relações privadas. O projeto ainda precisa ser sancionado pelo presidente da República.
Entre as alterações, está a suspensão dos prazos prescricionais e decadenciais até o dia 30 de outubro. O mesmo vale para os prazos envolvendo usucapião. Caso o PL seja sancionado, também ficará proibida a concessão de liminares de despejos. Levando em conta o isolamento e o crescente número de mortos, o período para fazer inventário e partilha de bens será estendido.
“Sabemos que a pandemia tem consequências, mas reconhecemos que nosso Direito Civil tem condições de lidar com esses casos. O que precisávamos era de pequenos ajustes e interferências para que o corpo do Direito Civil Brasileiro se preservasse e fosse aplicado com coerência e coesão”, prossegue Misasi.
LGPD
Uma das polêmicas envolvendo o PL foi a antecipação da vigência da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD — Lei 13. 709/18). Segundo a redação dada ao projeto de lei pelo Senado, a LGPD passa a valer já em agosto de 2020. Os artigos que tratam de sanções, entretanto, só entram em vigor em agosto de 2021.
Para Laura Schertel Mendes, a antecipação é benéfica. “Não tínhamos lei sobre o tema em vigor quando a pandemia foi declarada. Uma discussão que ocorreu foi: devemos postergar a lei, porque ela traria muitos gastos às empresas ou devemos aplicá-la, porque do contrário não teríamos todos os instrumentos de coleta de dados?”, explica.
Para ela, ainda que as sanções pudessem ser postergadas, era fundamental que a lei entrasse em vigor este ano, levando em conta a necessidade de fixar parâmetros legais para tratar a proteção de dados.
Ela conta que os Estados Unidos criaram leis esparsas, enquanto na Europa, tal como no Brasil, se optou pela implementação de medidas mais abrangentes, as chamadas “leis gerais”.
“Essa aprovação, postergando apenas as sanções, foi um passo muito relevante para que a LGPD entre em vigor já em agosto. Isso nos dá fôlego para mostrar a relevância e a conexão da proteção de dados com outros direitos fundamentais”, diz.
Outros países
Um estudo da Global Access to Justice fez um levantamento sobre as medidas administrativas e legislativas adotadas por 51 países e como eles procederam em relação ao acesso à Justiça durante a crise.
Clique aqui ou para ver a íntegra do seminário.
Fonte: Conjur