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6 de maio de 2020 Janaína Nunes Sem categoria
Aprovação pelo Congresso da MP 910 é essencial para pacificar o campo
Produtores rurais sem título de propriedade da terra vivem à margem da sociedade: não têm direito a usufruir políticas públicas, como programas de apoio à agricultura familiar e de acesso a crédito. Tampouco compartilham as obrigações de preservação impostas aos proprietários rurais regularizados pela legislação ambiental brasileira.
Ignorar a real situação de ocupação das terras públicas e das famílias em situação irregular inibe a atuação reguladora do Estado e acaba por incentivar ilegalidades. A falta de regularização fundiária induz à exploração ilegal de recursos naturais, à violência rural e urbana, à degradação ambiental e à insegurança jurídica no campo, comprometendo o bem-estar das populações afetadas e prejudicando o desenvolvimento sustentável do País.
Não obstante os grandes esforços feitos pelo governo de regularização fundiária nos últimos 50 anos, a maioria desses agricultores não teve acesso ao título de propriedade. Só nos últimos 15 anos a reforma agrária instalou 428 mil famílias. Desde a Constituinte de 1988, somando os projetos de colonização e reforma agrária, meio milhão de famílias foram assentadas na Amazônia Legal. Elas vivem marginalizadas na ilegalidade, apesar de trabalharem nas suas terras há décadas. A Medida Provisória (MP) 910 cria os mecanismos para reparar essa enorme dívida do setor público com os pequenos agricultores.
A regularização fundiária promove fiscalização, monitoramento e responsabilização ambiental pelo Estado e proporciona segurança jurídica e inclusão social a seus ocupantes. Com base na MP 910 será possível identificar quem ocupa terras públicas do Brasil, reconhecer seus direitos e exigir seus deveres e responsabilidades relativos à área ocupada. Esse espírito norteou sua criação. A MP moderniza o processo de titulação ao unificar e otimizar a legislação para terras rurais do Incra, dando tratamento eficaz e definitivo à complexa questão fundiária no Brasil.
A MP 910 não incentiva a grilagem. Ao contrário, ela mantém e amplia exigências para a regularização fundiária e cria uma base sólida para intensificar o combate à ocupação ilegal de terras públicas. Com medidas inovadoras em relação à legislação anterior, ela simplifica os processos para pequenos produtores, promove a proteção ambiental e garante os interesses de populações indígenas, quilombolas e tradicionais, proibindo a regularização em suas terras e em unidades de conservação.
Segundo dados do Incra, áreas de até quatro módulos fiscais, classificadas como pequenas propriedades, compõem cerca de 85% dos pedidos de regularização fundiária. Ao conceder isenção de custos para o registro de títulos dessas áreas, a MP atende à legislação vigente, que permite a gratuidade de alienação ou direito de uso a minifúndios. A MP 910 beneficia diretamente essa maioria de pequenos agricultores. Segundo dados da Embrapa, no bioma Amazônia, em pelo menos 1.815 assentamentos (78,5% do total), 362.157 famílias (72,5% do total) vivem em minifúndios, em lotes com áreas inferiores a um módulo fiscal.
Já no processo de regularização para pequenos e médios produtores, tecnologias de sensoriamento remoto permitem acelerar a comprovação de informações apresentadas em pedidos de regularização, em certos casos com dispensa de vistoria prévia. Essa facilidade não significa flexibilização total. A vistoria presencial continua sendo obrigatória, mesmo para pequenas propriedades, nos casos de existência de infrações ambientais ou embargos sobre o imóvel.
A MP 910 promove avanços na proteção do meio ambiente ao integrar, pela primeira vez, exigências ambientais à agenda de regularização fundiária. A inclusão do Cadastro Ambiental Rural (CAR) como documento obrigatório na regularização fundiária torna a recuperação de eventuais passivos ambientais uma condição para obtenção e manutenção do título.
Após a regularização, o proprietário rural passa a contribuir para os esforços de preservação ambiental, fortalecendo o combate ao desmatamento ilegal. As estatísticas demonstram estreita correlação entre titulação de terras e redução da derrubada ilegal de árvores. Números do Incra sobre assentamentos no Estado do Pará indicam: em 2017, o desmatamento em áreas não tituladas foi 134% maior que em áreas tituladas. Dados do Programa de Monitoramento da Floresta Amazônica Brasileira por Satélite (Prodes) mostram que cerca de 25% do desmatamento verificado em 2019 se deu em assentamentos de reforma agrária não titulados, enquanto outros 25%, aproximadamente, foram em terras públicas não destinadas.
Para normatizar definitivamente a questão fundiária no País é crucial abarcar o maior número possível de imóveis rurais e para isso o marco temporal proposto é fundamental. Não há como avançar sem reconhecer a realidade atual. É preciso definir um ponto de partida abrangente, desde o qual seja possível cumprir a função fiscalizadora do Estado.
A aprovação pelo Congresso Nacional da Medida Provisória 910/2019 é essencial para reparar enormes injustiças, pacificar o campo, proteger o patrimônio nacional e garantir o desenvolvimento sustentável do Brasil. Ela vem para resolver, não para perpetuar problemas.
Fonte: Estadão
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