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Artigo – Falta de transparência na pandemia da Covid-19 leva riscos à sociedade

É preciso suprir a ausência de dados para que a comunidade científica possa colocar à disposição da sociedade o conhecimento

Considerados epicentro da Covid-19 no Brasil, São Paulo e Rio de Janeiro ainda patinam na transparência da divulgação dos dados de casos e mortes provocados pela doença, passados mais de dois meses da declaração oficial da pandemia feita pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Apresentar diariamente o levantamento de registros da doença divididos por confirmados, suspeitos e descartados já não é suficiente para traçar rumos das políticas públicas a serem adotadas. Os dois Estados são usados como parâmetros de uma grave falha que o Brasil está enfrentando nesta crise, com poucas exceções municipais e estaduais.

Pelo sistema adotado na cidade de São Paulo, por exemplo, a divulgação diária de mortes tem sido feita por “confirmadas” e “suspeitas” por Covid-19. No cômputo oficial são levados em consideração os óbitos confirmados. Mas a diferença entre os dois dados chega a ser mais do que o dobro. Em 20 de maio, a planilha da Secretaria Estadual da Saúde (e também da Fundação Seade) contabilizava oficialmente 3.186 mortes na cidade de São Paulo. No mapa por distrito, a Prefeitura registrava 6.671 óbitos (3.186 confirmados + 3.485 suspeitos).

Isso tem impacto no total de mortes pelo novo coronavírus no Brasil, já que o Ministério da Saúde utiliza apenas os confirmados para a contabilidade comparável com outros países. O mesmo procedimento é feito pela própria pasta federal. Para se ter uma ideia do impacto desse “lapso” estatístico, também no dia 20 de maio, quando o país tinha 18.859 óbitos pela doença, havia outros 3.483 em investigação. Demonstra, no mínimo, a falta de integração entre os sistemas de registro da Covid-19 nas esferas federal, estadual e municipal. Lembrando que esses números são os que servem para tomada de decisões.

Entidades que defendem a transparência de informações públicas já vêm alertando desde meados de março para a ausência de microdados, mas ainda sem resposta. A Defensoria Pública da União chegou a propor ação contra os governos federal e de São Paulo (estadual e municipal) para garantir mais transparência a dados da pandemia alegando que são pouco detalhados e sem padronização. Não houve decisão judicial até agora.

Porém, algumas dessas informações (como sexo, cor, CEP de residência) têm notificação obrigatória tanto pelos sistemas de saúde por meio da ficha de investigação de suspeitos de contaminação pelo coronavírus como na certidão de óbito, emitida por Cartórios de Registro Civil e remetida a órgãos públicos, como INSS e Receita Federal. Se os documentos estão sendo preenchidos dentro da legislação, há negligência na divulgação por parte dos governos. Se não há o cumprimento legal da notificação, os sistemas são falhos e deveriam estar mais bem preparados.

No caso da divulgação, existem exceções — como o  município do  Rio de Janeiro ou o Estado do Espírito Santo — que detalham informações individualizadas sobre os pacientes, contudo sem violar a privacidade de cada um deles. O que é exceção deveria ser regra.

Transparência de dados públicos é direito do cidadão brasileiro assegurado na Constituição, que diz: “Todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado”.

Neste caso, é exatamente a abertura de dados que contribuiria para a formulação de estratégias localizadas para testagem, direcionamento de recursos da saúde e  financeiros. Isso, além de levar a um ganho de tempo nessa luta contra o vírus, permitiria mostrar com mais clareza o  caminho para o retorno gradual das atividades econômicas, profissionais e culturais.

É preciso urgentemente suprir esta ausência de dados sobre a pandemia para que a comunidade científica e pesquisadores possam colocar à disposição da sociedade o conhecimento acumulado e ajudar na análise do problema e de seus efeitos para apontar caminhos a serem adotados na saúde, educação, economia, entre outros. Se serão acatadas ou não as sugestões, é uma outra discussão.

Fonte: Jota Info

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